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  • Foto do escritorDaniela Carlos

A Depressão como perda de coração (Parte 1)

Este é um dos transtornos psicológicos mais prevalente na sociedade dos tempos modernos. Neste sentido esta merece uma abordagem honesta, inclusiva e flexível; um olhar que procure a integração de diferentes contributos sem, no entanto, procurar fórmulas mágicas ou vacinas milagrosas.


 

“Aquele bicho papão,

aquele arrepio na espinha em pleno calor de verão,

aquela amargura de alma,

aquela espiral descendente ao esconderijo mais profundo do ser;

Uma solução em suspensão que se dilui na realidade,

mas não se mistura;

Um estado de pausa do coração

numa vida que insiste em acontecer.”



O desafio que se coloca é, portanto, repensar o transtorno depressivo a partir de uma nova perspectiva, uma de distanciamento e questionamento. Quando colocamos o nosso enfoque na compreensão da mensagem que esta nos está a tentar transmitir, em vez de corrermos instintivamente à procura de um penso rápido que detenha a hemorragia e entorpeça os sentidos, estamos a criar espaço e distância para que o observador interno ganhe perspectiva, consciência e insight sobre aquilo que estamos a percepcionar como um problema na nossa vida. De repente, todo um espaço se abre, e com este, a possibilidade de admitirmos, a nós mesmos, que talvez a vida não necessite de ser experienciada assim. E, com essa pequena tomada de consciência, a verdadeira jornada começa...


“A depressão aparece quando deixamos de experimentar a bondade e vitalidade do nosso coração; e é um sentimento de pesar e opressão que deriva frequentemente da repressão da zanga e do ressentimento.” EDT

A depressão assenta, então, num processo de perdas, sendo a primeira identificada como a “perda do coração”. Esta perda de contacto com o nosso coração, a nossa bondade intrínseca, geralmente desencadeada por uma perda externa concreta (perda de um ente querido, trabalho, divórcio,...) ou percepcionada, é devida aos sentimentos de tristeza e fracasso subsequentes dessa mesma perda. Concomitantemente, estas perdas desmoronam os nossos pontos de referência “estáveis” (o trabalho, a relação, o estilo de vida, ...), aqueles de que nos servimos e dependemos como transmissores de segurança e do sentido que atribuímos à nossa vida.


No entanto, para uma pessoa deprimida estas perdas são hiperbolizadas e percepcionadas como indicadores directos e irrefutáveis de um fracasso que encaram de uma forma excessivamente pessoal, assumindo que existe algo intrinsecamente mal consigo. Desta forma, engorgitam-se sentimentos de inadaptação, de dúvida e de insatisfação bem como um sentimento indomável de perda de controlo. O mecanismo consequente de auto-preservação, devido à crença de que a sua pessoa é inerentemente má, faz com que seja demasiadamente doloroso entrar em contacto com a sua dor e a depressão consolida-se.


Este sentimento de culpabilidade, fruto de uma personalização e identificação excessivas com os factores externos e internos, é algo extremamente importante de reconhecer pois este desempenha um papel preponderante no estado anímico da pessoa: a culpa sentida pela forma como as coisas são, pela impotência de não controlarem a realidade, nem mesmo o sofrimento insidioso que experimentam, pelos sentimentos de tristeza e vulnerabilidade, pelo facto de não experienciarem a vida de uma forma plena e completa.


Neste movimento concêntrico descendente, a gratidão pela dádiva da vida fica esquecida, o coração fecha-se e a pessoa deprimida perde a sua capacidade de resposta ao mundo.

Cultural, e socialmente, fomos programados a fugir destas emoções carregadas de conotação negativa e tornamo-nos mestres da sua repressão e evitamento. Como foi abordado no post da Sombra (https://om-yogaterapias.wixsite.com/shanti/post/a-sombra-do-eu) a resistência provoca, paradoxalmente, um movimento de estagnação energética que nos impede de processarmos e expressarmos correctamente as emoções. Deste modo, estas acumulam-se e não encontram o seu mecanismo saudável de libertação, transformando-se em amargura o que, ao longo do tempo, se manifesta somaticamente.


Nesta perspectiva, a depressão como perda de coração é como uma rejeição da fluidez essencial à vida. O nosso próprio desejo ilusório de que o exterior se adapte às nossas expectativas é castrador, pois nada é permanente nem permanece imutável. É precisamente esta qualidade metamórfica, que permite que a vida crie e se recrie a todo o instante, que lhe confere a sua essência anímica e proporciona as oportunidades de crescimento e evolução. Negar este aspecto quintessencial da vida é rejeitar experiencia-la no seu espectro total e em plenitude.


A leveza do nosso coração depende, então, da aceitação da natureza mutável dos nossos pontos de referência, reconhecendo a sua incapacidade intrínseca em nos proporcionar o sentido de segurança e felicidade que tanto desejamos. Reconhecendo e abraçando esta impermanência poderemos mergulhar nas profundezas das experiências descansando na certeza da incerteza da vida!



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